domingo, 29 de novembro de 2009

Yeshua Ben Joseph

Sei que existo em plena solidão,
por isso me alisto na escola do perdão.
E da luz que brilha dessas páginas
sinto Jesus que enxuga as minhas lágrimas.
E depois ele pega a minha mão e me leva com seu doce sorriso
para um tempo que fica muito antes, mas muito antes da expulsão do paraíso.
Sei que existo todas as manhãs numa eterna-moderna felicidade.
Com Jesus Cristo nas Bodas de Canaã para todo sempre, para toda eternidade.

Sou o que sou porque sou da legião dos iluminados e dos escolhidos.

Sou o que sou porque sou da religião dos humilhados e dos ofendidos.

Yeshua Ben Joseph, Jesus, filho de José, para Leon Trotsky foi a primeira grande revolução da humanidade, talvez a maior, pois era a igualdade do homem perante Deus. Vestido de púrpura no Sermão da Montanha, ele disse: “Amai-vos uns aos outros, os primeiros serão os últimos, os últimos serão os primeiros.” Ele ressuscitou Lázaro, seu amigo. Ressuscita uma menina, e diz: “Menina, levanta.” Em aramaico é “Talita cumi”.

Antes de morrer e ressuscitar ele mergulhou na terrível angústia do desespero da derrota e diz: “Pai, pai, porque me abandonaste?”. Ele dizia: “Para perdoar o inimigo, para amar o inimigo.”

Mas ele também dizia: “Se alguém fizer mal a algum destes pequeninos que me acompanham, melhor seria que amarrasse uma pedra ao redor de seu pescoço e os jogasse no fundo do mar.”

O Brasil, um país-continente, com 30 milhões de crianças abandonadas, a maior nação católica do mundo, não estará pecando contra Yeshua Ben Joseph?

Quando ele chegou ao lado da mulher adúltera e enfrentou os linchadores que com pedras nas mãos queriam linchar de acordo com a lei sectária e dogmática da lei mosaica aquela mulher adúltera, ele ficou ao dela, dentro de um círculo, e encarando os linchadores, disse: “Atire a primeira pedra aquele que dentre vós nunca pecou.”

Adonai, Adonai, Adonai.

Jorge Mautner

( Kaótico, otimista e fatal!)

domingo, 22 de novembro de 2009

William Shakespeare

O solilóquio de Hamlet
(Ato III, Cena 1)



Ser ou não ser; essa é toda a questão:
Se mais nobre é em mente suportar
Dardos e flechas de ultrajante sina
Ou tomar armas contra um mar de angústias
E firme, dar-lhes fim. Morrer: dormir;
Não mais; dizer que um sono porá fim
À dor do coração e aos mil embates
De que é herdeira a carne!... é um desenlace
A aspirar com fervor. Morrer, dormir;
Dormir, talvez sonhar: eis o dilema,
Pois no sono da morte quaisquer sonhos
- Ao nos livrarmos deste caos mortal -
A paz nos devem dar. Esta é a razão
De a vida longa ser calamidade,
Pois quem do mundo os males sofreria:
A injustiça, a opressão, a vã injúria,
O amor magoado, as delongas da lei,
O abuso do poder e a humilhação
Que do indigno o valoroso sofre,
Quando ele próprio a paz encontraria
Em seu punhal? Quem fardo arrastaria,
Grunhindo, suarento, em triste vida,
Senão porque o pavor do após-a-morte
- Ignota região de cujas linhas
Não se volta - a vontade nos confunde
E nos faz preferir males que temos
A buscar outros que desconhecemos?
Assim nos faz covardes a consciência,
E o natural fulgor da decisão
Sucumbe à débil luz da reflexão;
E assim projetos de vigor e urgência
Em vista disto seus cursos desviam
E perdem o nome de ação. Oh, cala-te!
A bela Ofélia! - Ninfa, em tuas preces
Lembrados sejam todos meus pecados.*

Versão em português, de Luiz Angélico da Costa

segunda-feira, 16 de novembro de 2009



"Morder é tara? Tara é não morder."
Nelson Rodrigues

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Esse é nosso...

Bom Conselho

Ouça um bom conselho
Que eu lhe dou de graça
Inútil dormir que a dor não passa
Espere sentado
Ou você se cansa
Está provado, quem espera nunca alcança

Venha, meu amigo
Deixe esse regaço
Brinque com meu fogo
Venha se queimar
Faça como eu digo
Faça como eu faço
Aja duas vezes antes de pensar

Corro atrás do tempo
Vim de não sei onde
Devagar é que não se vai longe
Eu semeio o vento
Na minha cidade
Vou pra rua e bebo a tempestade

De Chico Buarque, esse é nosso! Q cabeça!

domingo, 8 de novembro de 2009

Alguns poemas

Mascarados
(Cora Coralina)

Saiu o Semeador a semear
Semeou o dia todo
e a noite o apanhou ainda
com as mãos cheias de sementes.
Ele semeava tranqüilo
sem pensar na colheita
porque muito tinha colhido
do que outros semearam.
Jovem, seja você esse semeador
Semeia com otimismo
Semeia com idealismo
as sementes vivas
da Paz e da Justiça.

Obs: A figura é de Sócrates não sendo um mascarado...
Esperemos
Pablo Neruda

Há outros dias que não têm chegado ainda,
que estão fazendo-se
como o pão ou as cadeiras ou o produto
das farmácias ou das oficinas
- há fábricas de dias que virão -
existem artesãos da alma
que levantam e pesam e preparam
certos dias amargos ou preciosos
que de repente chegam à porta
para premiar-nos
com uma laranja
ou assassinar-nos de imediato.

Obs: Quadro de Bosch, As tentações de Santo Antão
Lobos
(Hilda Hilst)

Lobos? São muitos.
Mas tu podes ainda
A palavra na língua
Aquietá-los.
Mortos? O mundo.
Mas podes acordá-lo
Sortilégio de vida
Na palavra escrita.
Lúcidos? São poucos.
Mas se farão milhares
Se à lucidez dos poucos
Te juntares.
Raros? Teus preclaros amigos.
E tu mesmo, raro.
Se nas coisas que digo
Acreditares.

Obs: foto de um vale em Cusco, Peru

Camas, banheiros, você e eu
(Charles Bukowski)

"nesta terra
alguns de nós amam melhor do que
morrem
mas a maioria morre
melhor do que ama
e nós morremos
aos poucos
parte por parte [ . . . ]


[ . . . ] nós não podíamos deixar
as coisas como estavam.
você me re-inventou
eu te re-inventei
e é por isso que
não mais estamos juntos [ . . . ]"

Obs: pintura de John Mellencamp